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quarta-feira, 28 de abril de 2010

Lula e o risco do pitoresco ao ridículo

ELIO GASPARI

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Uma política externa espetacular, quando gira em torno de um só personagem, arrisca virar companhia teatral
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O NOSSO GUIA precisa pisar no freio de seu desembaraço internacional. Quem viu algumas das expressões de perplexidade no plenário da reunião com chefes de Estado caribenhos, em Brasília, quando anunciou que "depois da Presidência, vou continuar fazendo política" teve uma ideia do efeito que a ligeireza verbal do Grande Mestre provoca em reuniões internacionais. Noves fora a platitude, o que desconcertou parte da audiência foi a utilização de uma reunião desse tipo para um improviso de palanque municipal.

Na política internacional sempre há lugar para personagens improváveis. Alguns, como o Mahatma Gandhi (um "faquir seminu", segundo Winston Churchill) ou Nelson Mandela, um prisioneiro sem rosto nem voz durante 27 anos, tornam-se figuras da história. Outros, como o jovem capitão Muammar Gaddafi, que destronou o rei senil da Líbia em 1969 e, quase septuagenário, ficou parecido com Cauby Peixoto, nas palavras de Lula.

A distância do improvável ao pitoresco é pequena e quase sempre benigna. Do pitoresco ao ridículo é imperceptível, porém maligna. O operário pobre que chega à Presidência de um país de 190 milhões de habitantes é uma história de sucesso em qualquer lugar do mundo. Não se pode dizer o mesmo do monoglota que tem o seu nome oferecido para a Secretaria-Geral da ONU, ou do latino-americano que sai pelo Oriente Médio oferecendo uma mediação desconexa, "risivelmente ingênua", na opinião pouco protocolar atribuída à secretária de Estado Hillary Clinton.

No auge da crise financeira de 2008, Lula sugeriu que partisse da ONU "a convocação para uma resposta vigorosa às ameaças", com uma reunião dos presidentes dos Bancos Centrais e ministros da Fazenda dos 192 países-membros da organização. Do presidente do Federal Reserve Bank americano ao ministro das Finanças do reino de Tonga, Otenifi Matoto.

Pode-se entender que o Brasil tenha negócios com a Venezuela e que Nosso Guia e seu comissariado tenham afeto nostálgico por Fidel Castro. Daí a abrir uma embaixada no campo de concentração do "Querido Líder" norte-coreano ou a receber em Brasília o cleptocrata uzbeque Islam Karimov, cuja polícia ferveu dissidentes, vai grande distância.

Toda política externa tem algo de teatral, mas o embaixador Marcos Azambuja ensina, há décadas, que "os diplomatas são produtores de blá-blá-blá, mas não são consumidores". A maior negociação diplomática ocorrida nos quase oito anos de diplomacia-companheira foi a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio. O chanceler Celso Amorim trabalhou pelo seu êxito, deu um drible de última hora na Índia e na China, caiu numa armadilha da delegação americana e amargou um fracasso.

Quando uma diplomacia acredita no próprio teatro, deixa de ser associada a uma política externa e é vista como uma companhia de espetáculos. Sobretudo quando essa diplomacia gira em torno de um personagem-ator. Ainda falta algum chão para que Nosso Guia ganhe um retrato na galeria dos governantes pitorescos, como Silvio Berlusconi ou Boris Yeltsin de seus últimos anos, mas o caminho em que entrou pode levá-lo até lá.(?)

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